Artigo de Prof. Dr. Arthur Pinto Chaves - Inovação Tecnológica na Mineração
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Inovação Tecnológica na Mineração (Parte I)

Inovação Tecnológica na Mineração (Parte I)

É comum ouvirmos dizer que “as indústrias de mineração e metalurgia são extremamente conservadoras e não aceitam inovação nenhuma”.

Essa informação não procede. E vou mostrar porque.

Essas duas indústrias estão na etapa inicial de todos os processos produtivos.  Por isso, recebem pressões enormes dos setores econômicos a jusante e de toda a sociedade. Irei detalhá-las a seguir.

 

PRESSÕES:

  • ECONÔMICAS

    •  Se o minério ou o metal for caro, encarecerá toda a cadeia produtiva. Aço caro implica em chapas, barras, vergalhões e tubos caros, que encarecerão todos os produtos da indústria mecânica, automobilística, naval, ferroviária etc., incluindo a de construção civil. Tais fatores induzem à uma pressão para a manutenção de preços baixos.
  • DA CONCORRÊNCIA

    • Hoje a produção é globalizada. Temos que concorrer com produtos chineses e de outros países, cuja economia não é de mercado.  A pressão para baixar os preços é novamente inevitável!
  • DA SOCIEDADE

    •  A sociedade quer consumir cada vez mais bens, mas os quer baratos.
  • AMBIENTAIS

    • Os ecologistas de plantão escolheram a mineração e a metalurgia de base como seus vilões prediletos. Tratam este assunto como uma questão de fé, ignorando aspectos econômicos e sociais. Ignoram também a total dependência de toda a nossa civilização dos produtos da mineração e a ética com que o tema é tratado por estas indústrias.
  • ALÉM DISSO

    • Minérios cada vez mais pobres, mais difíceis e mais finos. Locais cada vez mais longínquos – o esgotamento das jazidas fáceis de trabalhar e localizadas convenientemente obriga a fronteira mineral a se mover.  No caso brasileiro, para locais longínquos, atualmente dentro da Floresta Amazônica.  Nestes locais, não existe nenhuma infraestrutura. O governo é totalmente omisso. E o industrial é obrigado a arcar com os custos de gerar esta infraestrutura.  Sem poder repassar estes custos para o produto.

Neste ambiente tão agressivo e competitivo, a melhor alternativa é buscar a inovação.

Exemplo

A Vale foi fundada em 1942, lavrando a hematita que ocorre no topo das montanhas do Quadrilátero Ferrífero. A capa da revista Brasil Mineral referente aos 75 anos desta companhia é muito expressiva (Figura 1):

Figura 1: Capa da revista Brasil Mineral, de maio de 2017, com destaque para os 75 anos da Vale.

Lembrando aos leitores de que a formação das jazidas de minério de ferro naquela região é basicamente laterítica:  milhões de anos de chuvas e temperaturas médias elevadas solubilizaram todas as espécies minerais solúveis e deixaram apenas aquelas insolúveis – os minerais de ferro principalmente.

Formou-se um horizonte superior de hematita, um horizonte subsequente de itabirito, ambos sobre o substrato do proto-minério não lixiviado.

Posteriormente, ocorreram fenômenos intensos de dobramento, que endureceram e elevaram este horizonte de hematita.  Os principais picos da região do Quadrilátero são de hematita. Dentre tantos, alguns exemplos são o Pico do Itabirito, a Serra da Conceição e os já lavrados picos do Cauê e de Conceição.

Esgotadas as reservas de hematita, o itabirito estava descoberto e a atividade seguinte foi lavrá-lo. A partir disso, apareceu a necessidade de concentrá-lo.

Iniciam-se as mudanças

Em 1970, iniciou-se a concentração de itabiritos na usina do Cauê, Itabira, MG, usando o processo de separação magnética a úmido de alta intensidade – HIWMS (“High Intensity Wet Magnetic Separation”).  Pela primeira vez no mundo, foram introduzidos os separadores Jones.

Nem os alemães que os venderam sabiam operá-los.

Nós, os brasileiros (Prof. Paulo Abib Andery e equipe da Vale), é que aprendemos, ensinamos e tivemos que corrigir o projeto – errado conceitualmente devido ao desconhecimento deste equipamento por parte dos projetistas.  Ressalte-se que, à época, era a maior usina do mundo – 35 milhões de toneladas anuais.

Dois anos depois, entrou em operação uma segunda usina, também em Itabira, a usina de Conceição, usando outra tecnologia inovadora: a flotação reversa.

O que é flotação reversa?

Na América do Norte, há muito concentravam-se os taconitos por flotação direta (do mineral de minério, a hematita, e depressão dos minerais de ganga, principalmente o quartzo).  Como o itabirito é mais rico, foi mais conveniente fazer a flotação reversa. Isto é, flotar o quartzo, presente em menor quantidade, e deprimir a hematita, o que exigiu o desenvolvimento desta técnica até então inédita industrialmente.

A partir de 1981, o centro de gravidade da produção de minério de ferro começou a deslocar-se para a Serra dos Carajás, no Pará.  O processamento consistia na britagem, peneiramento e deslamagem do minério extremamente rico e de características metalúrgicas excepcionais.  Gerava-se certa quantidade de rejeito fino, disposta em barragens de rejeito.

Nova forma de peneiramento

Em 2013, com a crescente intolerância quanto a este método de disposição, passou-se ao beneficiamento a seco.  Isso não é fácil, pois a umidade do minério dificulta a separação granulométrica em peneiras:  a água presente faz com que as partículas adiram umas às outras e movam-se solidariamente, impedindo a sua separação.  Um novo equipamento, peneiras com acionamento em movimento helicoidal (em oposição aos movimentos circular e retilíneo convencionais) precisou ser desenvolvido e constitui-se em mais uma inovação tecnológica brilhante.

Atualmente, o ITV – Instituto Tecnológico Vale, em Ouro Preto, MG, trabalha com a otimização da flotação através do controle da Hidrodinâmica das células. Isso evita que a agitação excessiva arraste partículas finas de hematita para o flotado.

Samarco

Ao mesmo tempo e independentemente, a Samarco, em Mariana, MG, fez outras inovações.  Em 1977 implantou um projeto de lavra, beneficiamento e produção de pellet feed (PF), num universo governado pela produção de sinter feed.  Com o tempo, firmou-se como o maior exportador mundial de pelotas e, grande inovação, pelo transporte de PF por um mineroduto de quase 400 km, que ainda hoje, 40 anos decorridos, e é bench mark em termos mundiais.  E que já teve a sua segunda e terceira linhas implantadas.

Mais uma inovação: colunas de flotação

Para transportar o concentrado pelo mineroduto, ele precisa ser moído.  A diminuição da granulometria traz uma liberação adicional.  Desta forma, surge a possibilidade de flotá-lo mais uma vez e, assim, aumentar o teor de ferro e diminuir o teor de sílica.  Entretanto, o minério torna-se muito fino para  ser flotado nas células mecânicas clássicas.  Em 1991, implantou-se a flotação em colunas (Figura 2).  A Samarco instalou suas primeiras colunas de flotação apenas 10 anos depois desta tecnologia ter sido usada industrialmente pela primeira vez, no Canadá.  Hoje o Brasil tem uma das maiores populações de colunas do mundo.

Figura 2: Colunas de flotação
Figura 2: Colunas de flotação

O esforço inovativo continua.  Em 2017, foi defendida na EPUSP uma dissertação de mestrado de um engenheiro e pesquisador da Samarco descrevendo o esforço continuado, agora com células pneumáticas.

 

continuação: Inovação Tecnológica na Mineração (Parte II) – Em breve

 

Autor: Prof. Dr. Arthur Pinto Chaves

Artigo baseado na primeira parte da palestra proferida em 3 de julho de 2017 para a APEMI –  Associação Paulista de Engenheiros de Minas no auditório do Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo, EPUSP

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Escrito por Prof. Dr. Arthur Pinto Chaves

Possui graduação em Engenharia Metalúrgica, (1969), mestrado em Tecnologia Mineral (1972), doutorado (1983), livre-docência (1989), Professor Titular (1992), todos pela Universidade de São Paulo. Pós-doutorado na Southern Illinois University at Carbondale- USA. Atualmente é professor colaborador MS-6 no Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo da EPUSP. No passado foi engenheiro junior do IPT, assessor da diretoria do IPT, Gerente de Processos Minerais da Paulo Abib Engenharia S/A, Gerente de Planejamento e Desenvolvimento das Empresas Brumadinho, Gerente de Operações e Mercado da Promon Engenharia e professor colaborador MS-5 no Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Engenharia de Minas, com ênfase em Tratamento de Minérios, atuando principalmente nos seguintes temas: tecnologia limpa, beneficiamento, tecnologia mineral, tratamento de minérios e flotação. (Fonte: Currículo Lattes)

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